A autora J. K. Rowling foi entrevistada recentemente para a revista FWords with JAM, que tem como público-alvo leitores e potenciais escritores de literatura. Numa conversa sobre os temas mais variados, Jo falou pouco ou quase nada sobre Harry Potter, sendo mais questionada sobre as coisas que pouco interessa aos jornalistas comuns normalmente: sua própria formação de escritora.
Ela nos revela seu livro de infância predileto e também aquele que teria mudado sua vida. Sua opinião sobre os e-books (livros eletrônicos) e também sobre o debate literário que está acontecendo atualmente na acadêmica (as distinções entre gênero ficção e literatura de ficção). Conta um pouco sobre a sala onde ela trabalha, como consegue administrar o seu tempo e sobre sua surpreendente habilidade de conseguir escrever com os pés.
Jo também demonstra uma forte opinião em relação ao preconceito de gênero que existe nas premiações de literatura e mais.
Leia a entrevista na íntegra, completamente traduzida, abaixo. Veja o resto da revista na edição gratuita online.
Qual(is) foi(ram) seu livro(s) predileto(s) na infância?
"O Segredo do Vale da Lua", de Elizabeth Goudge. O tom é perfeito: uma mistura descosturada de conto de fada e realidade. Também há uma heroína simples, que me encantou quando criança de uma maneira que não consigo expressar com palavras, pois fui uma criancinha muito comum e eu não havia conhecido tantas heroínas literárias que eram maravilhosas de suspirar. Os parágrafos introdutórios de "O Segredo do Vale da Lua" ficaram comigo por toda minha vida. Goudge diz que existem três tipos de pessoas neste mundo: aquelas que acham consolo na comida, aquelas que acham consolo na literatura e aquelas que encontram consolo em sua própria beleza exterior. Sei que li "Little Women" (sem tradução brasileira) aos oito anos, pois nos mudamos pouco depois, quando fiz nove anos. Naturalmente, me identifiquei completamente com Jo March, ela, de ambição literária pulsante e de pavio curto. Minha mãe tinha tudo que Georgette Heyer escreveu, então passei por eles, também, quando virei pré-adolescente, até que FINALMENTE encontrei uma heroína simples lá, também (Phoebe, de "Sylvester", que também - aê! - virou escritora). Basicamente, vivi para os livros, e era sustentada por personagens literários com os quais me identificava - era das mais comuns traça de livro, e ainda era sardenta e usava óculos baratos.
Escritores sempre se queixam de pouco tempo que dispõem. No meio de responsabilidades para com a família, trabalhos para a caridade e exigências da editora, como você encontra espaço criativo?
Você precisa ser altamente disciplinada. Na sua biografia maravilhosa de Colette, "Secrets of the Flesh", Judith Thurman esreveu que ser mãe e escrever "são, às vezes, ocupações conflitantes" - verdade. Meus filhos vêm antes do meu trabalho, mas quando estou fundo em um romance, escrever vem antes de responder a emails e a cartas, retornar ligações, fazer trabalhos mundanos pela casa - quase tudo. Disto você deduz que eu tenha amigos excepcionalmente pacientes (como você bem sabe) e um marido maravilhoso e tolerante.
E-books - Nêmesis ou Gênesis?
Gênesis. Não faz sentido tentar impedir o progresso, mas a impressão nunca vai acabar; não há substituto para a sensação de um livro de verdade. Adoro fisicamente virar as páginas e poder sublinhar passagens e não se preocupar sobre deixá-los cair na banheira ou acabar a bateria. Também acho que livros impressos são objetos belos, e não falo de uma preciosa, primeira edição, mas como alguém que ama um novo e brilhante livro em brochura ou o cheiro de um livro de segunda-mão. Entretanto, existem momentos em que os e-books são "enviados por Deus". Esquecemos de despachar um livro para a hora de dormir para minha caçula e adorei de verdade a magia de poder baixar um em segundos! Este verão será o primeiro em que levarei cinquenta e-books para ler enquanto estamos viajando e é melhor do que encher minha mala de livros impressos.
Existe algum livro que mudou sua vida? Se sim, como?
Bem, descartanto a resposta óbvia ("Harry Potter e a Pedra Filosofal"), iria em "Hons and Rebels", de Jessica Mitford (sem tradução brasileira). Minha tia-avó pensava que Jessica Mitford era uma personagem simples deplorável (Mitford fugiu de sua família da alta sociedade para se tornar comunista e se juntar à guerra contra Franco na década de 30), e eu entreouvi ela falando à minha mãe tudo sobre ela quando eu tinha catorze anos. Mostrei interesse, então Tia Ivy me deu uma cópia velha da autobiografia de Mitford, muito contente, sem dúvida alguma, de vê-la sair de suas respeitáveis estantes. Foi um livro muito perigoso a ser presenteado a uma adolescente instatisfeita com tendência de esquerda. Jessica Mitford imediatamente se tornou minha heroína. Li tudo que ela escreveu e acabei dando o nome de minha filha mais velha em sua homenagem.
Você poderia descrever sua sala de leitura e o que ela tem de interessante?
Divido uma sala de estudos com meu marido, então há dois computadores, um de costas para o outro, em uma mesa para dois, mas tenho a sala só para mim durante o dia. Meu lado da mesa é um perigo à saúde. Ao meu redor, enquanto digito isto, há: uma casca de laranja seca, uma caixa plástica vazia na qual havia mirtilos (blueberries), meia sacola de pretzels salgados (há duas semanas está aqui), uma caixa vazia que continha colírios, uma tonelada de livros de referência, um telefone fora de vista, em meio a pedaços de papéis, alguns jornais antigos, muitas canetas (a maioria sem funcionar), um par quebrado de óculos-de-sol e um único brinco sem par. O resto da sala está bem desarrumada, também, mesmo que não como o meu lado da mesa. Adoraria culpar o Neil por alguma coisa, mas realmente sou eu. Sou muito melhor organizando ideias do que pilhas de papéis. Deveria adicionar que posso, e que consigo, escrever em qualquer lugar da minha casa e em muitos outros lugares, também. Adoro escrever na cama, e tenho uma cadeira favorita na nossa sala de estar, onde às vezes vou com meu laptop se estiver querendo uma mudança de ambiente. Minha adoração por cafés também é conhecida.
O que a faz vibrar ou ficar depressiva sobre o mundo da publicação hoje em dia?
Não estou muito dentro deste atualmente, não tendo publicado há alguns anos. Meu agente diz que está sendo um tempo difícil para alguém desconhecido conseguir ser publicado, mas ainda acredito que se você tiver a coragem necessária, vai triunfar alguma hora.
Há algum livro que você relê?
Muitos e muitos. Quando estou trabalhando, acho incrivelmente difícil ler livros novos (mas quando estou entre a escrita de meus próprios romances, devoro os de outros autores). Então se estou escrevendo, eu releio. Já reli todos de Jane Austen tão constantemente que posso até visualizar o desenho da letra na página; amo Colette, Katherine Mansfield, Dorothy L. Sayers, Ngaio Marsh, E. F. Benson e P. G. Wodehouse, todos eles estão ao lado da minha cama. Leio muitos diários e biografias, também; Chips Channon também está na prateleira do lado da cama, assim como o já mencionado "Secrets of the Flesh", e tudo de Fances Donaldson é eminentemente relível.
Que palavra ou frase você usa demais - na escrita ou na vida?
Não tenho orgulho em dizer que no dia-a-dia sejam, provavelmente, palavrões. Escrevendo os livros de Potter, fiquei enjoada das palavras "passagem", "corredor" e todas aquelas relacionadas com os movimentos infinitos de meus heróis pelo castelo de Hogwarts.
A. S. Byatt deu o que falar quando disse que o Orange Prize era chauvinista. Você acha que mulheres precisam de uma plataforma separada para o reconhecimento?
Bem, não há dúvida que escritoras são pouco representadas quando falamos em ganhar grandes prêmios de literatura (contrastando com os prêmios de literatura infantil, que são mais ou menos de forma igualitária). Claramente há duas possíveis conclusões a serem levantadas em relação a homens serem sempre reconhecidos e ganhadores de prêmios; ou as escritoras não são tão talentosas como os escritores ou o mundo do grande prêmio literário ecoa a pouca representação da mulher em outras áreas da sociedade. Apóio a segunda visão, então diria que o Orange Prize faz um trabalho útil em dar às melhores escritoras do dia o tipo de exposição que eles talvez não dariam se não acontecesse assim.
Confesse suas leituras prazeirosas de "culpa".
Aquelas do tipo "quem matou?", especialmente da Era de Ouro - Christie, Sayers, Allingham e Marsh. Embora, sendo honesta, não me sinta culpada sobre eles. Ler revistas ruins é que dá mais vergonha de mim mesma.
"Harry Potter e a Pedra Filosofal" foi publicado em 1997. Desde lá, como você mudou como escritora?
Espero que tenha melhorado. Acho que melhorei.
O debate que não tem fim que aflorou recentemente sobre literatura: Quão distinta é a ficção de literatura do gênero ficção no seu ponto de vista?
Sempre houve uma sobreposição. A mais nova ideia, a de J. G. Ballard, sendo o exemplo moderno que vem em mente; um autor maravilhoso que "transcende" do gênero ficção científica. Sou bastante indiferente em relação à distinção entre ficção "literária" e "gênero" ficção, e salto livremente entre os dois como leitora mesmo que eu esteja "degradando". O chamado "gênero" ficção nos deu personagens imortais como Sherlock Holmes, Ford Prefect e James Bond, que têm influenciado para sempre nossa cultura e língua; então qual é a de ser esnobe em relação a isso?
Diga-nos seu(s) talento(s) secreto(s) - fora os bolos.
Eu ia dizer os bolos, o que me deixa sem saber o que falar. Gosto de resolver os Sudokus mais difíceis - isto conta como talento? Também tenho dedos dos pés preênsis, embora na verdade imagine que isto seja uma deformação. Ninguém nunca gosta de me ver escrevendo com meus pés. (ScarPotter)
[OMG! Ela consegue escrever com os pés!] J. K. Rowling revela gostos e opiniões sobre diversos assuntos em entrevista.
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